sexta-feira, 4 de abril de 2008

Tá fácil, não, viu?
Não é que no mesmo dia que perdemos Fatoca, no exato instante que eu liguei pra avisar minha mãe sobre o ocorrido, ela estava passando por uma cirurgia complicada para colocar pino e placa de platina no fêmur esquerdo por causa de uma queda? E você sabia disso? Pois é, eu também não. Aliás, só fiquei sabendo no dia seguinte, ao tentar ligar pro celular dela e a bruta que trabalhava lá em casa atender e dizer: "a Dra. não pode atender o celular porque está na UTI".
Pois então... imagina aí toda a culpa que eu já sinto normal e cotidianamente por não estar fisicamente perto da veinha potencializada por não estar presente quando ela caiu, não poder acompanhá-la ao hospital, não confortá-la antes da cirurgia, não estar lá quando ela saiu e NÃO TER INSISTIDO PRA FALAR COM ELA NA QUARTA A NOITE. Por comodidade, porque eu estava tão abalada com a ida de Fatoca, porque eu quis avisar outros amigos pra darem uma força pro marido, por preguiça, por não querer incomodar, por não querer realmente dar a notícia com medo da minha mãe ficar triste ou sofrer, eu deixei o telefone tocar até desligar e não insisti. Pensei cá com os meus botões: "lá vai ela de novo. não atende o telefone. tudo bem, amanhã eu ligo."
Resultado: cheguei ao trabalho na quinta-feira, triste ainda, e tomei o choque, susto, etc. Pânico, choro, aeroporto, primeiro vôo, unhas roídas, ansiedade, chegada e, finalmente, visita à mãe na UTI. A cirurgia tinha sido ok, mas devido à perda de sangue, houve anemia e hipotensão que inspiravam cuidados. Três dias de visitas esparsas e exíguas à UTI, que me consumiram e fizeram perceber quanta falta me faz um rito de fé. Minhas conversas com o Superior, minha esperança e minha racionalidade não são suficientes para o amparo necessário numa hora dessas. Os católicos rezavam, os evangélicos oravam e eu lá, mandando minhas energias positivas, minhas ondas de luz. Acredito que elas sejam eficazes, mas eu não tinha uma ritual no qual me apoiar.
No sábado, minha mãe foi pro apartamento. Foi uma noite terrível, porque a coitada, depois dos dias da UTI estava fragilidada, estressada, cansada. Foi uma noite de vigília e um pouco de desespero. Nunca tinha ficado num hospital com um paciente que realmente precisasse de cuidados. Sempre foi companhia, nunca tinha sido vigilante. Foi uma noite que me trouxe a maturidade que por tanto tempo refutei. É isso. Agora sou adulta. Sou responsável. Agora cresci de vez. A bola tá comigo.
No domingo de aleluia e nos dias e noites seguintes, tudo ok. Recuperação mais tranquila e a certeza que a minha presença é necessária para o bem estar da minha mãe. A culpa, o dilema da distância, o trabalho, a vida. Hora de pensar muito e chegar à conclusão que tenho que ser forte, porque nada posso fazer a não ser continuar. Não posso mudar minha vida. A escolha já foi feita. Só posso ascender. E cuidar.
Nesse meio tempo, milhares de reais gastos com a passagem ida e volta para São Paulo na terça para poder ir à entrevista no consulado americano. Malditos. Depois de 5 horas e somente uma pergunta, eles me acharam apta a pisar no solo do Tio Sam. Vôo de volta na madrugada da quinta e, finalmente, a alta do hospital. Levei minha mãe para casa, dependi da boa vontade e ajuda de estranhos, demiti a funcionária bruta e saí pra tomar um espumante com amigos, com a impressão que o mundo ia cair na minha cabeça.
Na sexta, o mundo voltou a entrar nos eixos. Contratei dois anjos capacitados a tomar conta da minha mãe, acertei o revezamento das folgas, deixei a casa mais ou menos em ordem e voltei na segunda para o trabalho. Quase falida, com o coração apertado, cheia de trabalho acumulado, morta de preocupação, porém mais resignada. Não vou alterar meus planos. Tenho só que ajustar algumas coisinhas pendentes, que me levam de volta hoje à Fuxtia, e garantir que minha mãe esteja bem assistida, acarinhada e confortável. O resto é seguir em frente. Respirando.

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